domingo, 31 de agosto de 2014

Bordado

Conexão cibernética
Atração astral
Pessoas de carne
Vícios e tal

Um encontro
Dois seres 
Aparência
Ideal

Visão
Tato
Olfato
Que tal?

Virtual
Consensual
Sensorial

Me bordei em você
Fatal
Por Marianna Rosalles

segunda-feira, 25 de agosto de 2014

Ser mulher em SP


Ser mulher em SP é sair sozinha pela cidade
Ser mulher em SP é ouvir pelo menos uma cantada ao andar sozinha pela cidade
Ser mulher em SP é voltar irritada para casa por ter ouvido uma cantada no caminho
Ser mulher em SP é se sentir impotente
Ser mulher em SP é chamar um amigo homem para ir com você em certos lugares para se sentir mais segura

Ser mulher em SP é ouvir o amigo esquerdista contar como foi engraçado quando ele e os amigos apostaram quem ia pegar 'a gorda' na balada

Ser mulher em SP é ter amigos homens que desconstroem seu machismo
Ser mulher em SP é conhecer o feminismo via facebook
Ser mulher em SP é perceber que o feminismo nunca foi citado em toda a sua vida escolar
Ser mulher em SP é não ter certeza se é feminista ou não


Ser mulher em SP é gostar de cavalheirismo
Ser mulher em SP é não gostar de cavalheirismo
Ser mulher em SP é ser oprimida pela mãe por iniciar sua vida sexual 'cedo demais'

Ser mulher em SP é ser oprimida pela mãe por iniciar sua vida sexual 'tarde demais'
Ser mulher em SP é optar por se depilar ou não
Ser mulher em SP é sair de saia curta
Ser mulher em SP é sair de saia longa

Ser mulher em SP é ser negra, pobre e trans*
Ser mulher em SP é ser branca burguesa e cis
Ser mulher em SP é ouvir que a sua classe social oprime as demais
Ser mulher em SP é optar por quebrar os padrões de sua classe social


Ser mulher em SP é escolher fazer engenharia
Ser mulher em SP é decidir estudar

Ser mulher em SP é ouvir piadas sobre agressão doméstica no cursinho
Ser mulher em SP é participar da Frente Feminista da sua universidade
Ser mulher em SP é trabalhar
Ser mulher em SP é ganhar menos que um homem em um cargo equivalente


Ser mulher em SP é não ter seus direitos preservados
Ser mulher em SP é se interessar pela política
Ser mulher em SP é não se interessar pela política
Ser mulher em SP é saber que existem candidatas que lutam pelos direitos da mulher
Ser mulher em SP é ver mulheres reproduzindo discursos machistas


Ser mulher em SP é ver as companheiras de luta reagindo às opressões
Ser mulher em SP é se orgulhar das Severinas e sua revolução no Sertão

Ser mulher em SP é ter voz
Ser mulher em SP é resistir
Ser mulher em SP é lutar pela mudança
Ser mulher em SP é ter esperança.



Por Marianna Rosalles

terça-feira, 5 de agosto de 2014

Só a antropofagia concretiza Utopias


Carlos Drummond de Andrade apresenta em sua obra "Sentimento do Mundo", uma ideologia que reafirma os ideais modernistas e propõe um caminho para restaurar a humanidade. Segundo o autor, o indivíduo singular é insuficiente e deve tornar-se conhecedor de suas mínguas e, a partir daí, adotar uma postura antropofágica na busca pela evolução. A união de várias insuficiências concebe um todo suficiente porém instável, já que está sempre em busca de progresso. Assim, seria a proposta de Drummond mera Utopia? 

É possível afirmar que não. Na literatura, "a Cidade e as Serras", de Eça de Queirós, relata a transformação moral de um indivíduo, o burguês Jacinto, através do deslocamento do egocentro para o sociocentro e do exercício do questionamento de padrões massificados. Guiado por Zé Fernandes, Jacinto percebe que não há igualdade natural, a harmonia surge da diferença. Qualquer semelhança com os ideais do poeta não é mera coincidência. Eça de Queirós, anos antes, em sua obra exemplifica e reforça a possibilidade de aplicação da tese de "Sentimento do Mundo".

O primeiro passo para a execução da estratégia de Drummond no mundo contemporâneo seria a adoção de uma atitude antropofágica. Essa deveria ser disseminada a partir da escolarização básica: Paulo Freire, em sua obra, propõe uma educação crítica, na qual o estudante é sujeito ativo e aprende a desenvolver uma inquietude na busca por sanar suas incompletudes. O caminho para que isso ocorra está nas relações, tanto professor-estudante quanto estudante-estudante. Dessa forma, a importância do coletivo seria reforçada no cotidiano, resultando na construção de um singular suficiente.

Outro elemento que contribui para o andamento da proposta Drummoniana é a globalização e a acessibilidade à informação. O mundo está interligado através da internet, a popularização das redes sociais comprova a existência da necessidade de comunicar-se com o outro, compartilhar e curtir experiências. Resta sair do plano virtual e ir para o plano real. 

No entanto, mudanças sociais demandam tempo e engajamento, afinal uma reforma ideológica depende da adesão do todo, e cada um tem seu tempo para compreender e optar pela quebra de seus paradigmas. Abraçar essa escolha, a de ter uma atitude modernista, não se dá em curto prazo. Mas a solução proposta pelo poeta não é inexequível. 

É importante ressaltar que a ruptura de padrões não é um processo singelo, pelo contrário, quebrar-se é uma etapa agressiva, é necessário rever-se, ter uma abertura para mudanças de antigos pensamentos e atitudes. O contexto atual de Regime Capitalista, que prega a livre concorrência e alimenta uma postura individualista, dificulta ainda mais esse processo de conscientização da importância de cada um no coletivo, e do exercício do amor ao próximo e ao distante. A única forma de concretizar Utopias é por meio dessa atitude antropofágica. Assim, a partir dos cacos singulares provenientes desse processo, será possível construir um mosaico, a suficiência.



Por Marianna Rosalles